Na Argentina, Lula diz que Brasil é dono do próprio nariz
MARCIA CARMO
de Buenos Aires para a BBC Brasil
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quinta-feira em Buenos Aires, durante encontro com a presidente argentina Cristina Kirchner, que o Brasil "só deu certo quando foi dono de seu nariz".
"Agora começam a dizer quanto o Brasil vai crescer, quanto a Argentina vai crescer. Não quero ser desrespeitoso, mas o Brasil só deu certo quando foi dono de seu nariz", afirmou, ao lado de Kirchner.
O discurso de Lula foi feito um dia depois de divulgada a previsão do FMI (Fundo Monetário Internacional) de retração da economia global, com expectativa de queda de 1,3% do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro.
"Se fossem tão fiscalizadores das crises como foram da Argentina e do Brasil, saberíamos desta crise [internacional] três anos antes", disse.
O presidente destacou ainda que a crise é uma "oportunidade" para que cada país implemente suas medidas, sem atender recomendações de organismos internacionais.
"A crise é oportunidade para fazermos o que não podíamos porque haviam as normas de Basiléia [sede do Banco Internacional de Compensações, que reúne os Bancos Centrais do mundo], do FMI e do Banco Mundial. E agora temos que criar as nossas regras."
"Medo de crise"
Lula iniciou suas declarações, dizendo que "as pessoas têm que entender que não podem mais tratar Argentina e Brasil como na década de oitenta".
Lula também sugeriu que, em vez de falar de crise, se comece a falar na etapa pós-crise internacional.
"Não tenho medo de crise. Sou de uma região do Brasil onde se a criança tiver medo de crise, nem nasce".
Também nesta quinta-feira, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, criticou as projeções feitas pelo FMI.
Protecionismo
Esta é a terceira reunião entre Lula e Kirchner depois que os dois líderes decidiram realizar encontros semestrais para estreitar as relações entre seus países.
Lula falou sobre a "importância" da integração bilateral, num momento em que o comércio entre os dois países registra forte queda --de cerca de 50% nos primeiros três meses deste ano frente ao mesmo período do ano passado.
Empresários dos dois países tentam chegar a acordos setoriais, depois que o governo argentino adotou, recentemente, medidas alfandegárias que atrasaram o desembarque das mercadorias, afetando produtos do Brasil.
Pouco antes, numa rápida coletiva, Cristina defendeu a postura argentina, falando da importância de se "defender o emprego e a indústria nacional" nestes tempos de turbulência econômica internacional.
"Não olhemos apenas para as alfândegas quando falamos em protecionismo. Olhemos também para questões cambiais e fiscais para não responsabilizar só questões de alfândega", disse ela.